A política de aproximação conduzida até 2008 pela Coreia do Sul com sua vizinha Coreia do Norte não produziu resultados. Mas a linha dura adotada desde então também mostra seus limites
Reina uma tranquilidade não isenta de incerteza na península sul-coreana, no dia seguinte ao tiro de artilharia entre as duas Coreias que causou a morte de dois soldados sul-coreanos, de pelo menos dois civis, e cerca de 15 feridos.
As duas partes se acusam mutuamente de terem começado esses bombardeios – um dos mais graves incidentes desde a assinatura do armistício de 1953 – e ameaçam uma à outra com “represálias severas”. Ao mesmo tempo em que chamam os tiros norte-coreanos de “ato belicista”, Seul e Washington procuram evitar uma escalada.
Segundo Pyongyang, esses tiros de uma centena de peças de artilharia foram a resposta a manobras militares do Sul, próximas a sua costa. Depois de ter enviado diversas mensagens pedindo a interrupção desses exercícios, a artilharia norte-coreana abriu fogo sobre a pequena ilha de Yongpuong situada no Mar Amarelo (Mar do Oeste), a cerca de dez quilômetros de seu litoral. Segundo o “New York Times”, o vice-ministro da Defesa sul-coreana, Lee Yong-gul, reconheceu que exercícios de tiro realmente eram feitos pelas forças sul-coreanas na área. Essas manobras mobilizam 70 mil homens.
O Norte não contesta a soberania do Sul sobre o cordão de ilhas que inclui Yongpyong, mas não reconhece a linha marítima norte que estende até o mar a zona desmilitarizada que separa as duas Coreias, a qual foi traçada unilateralmente pelo comando das Nações Unidas em 1953.
Após a cúpula entre Coreias de 2007, os dois países haviam concordado em criar uma “zona de pesca de paz” nessa parte do Mar Amarelo. Com a chegada ao poder em 2008 do presidente Lee Myung-bak, que adotou uma linha dura frente a Pyongyang, esse projeto nunca teve continuidade. Ocorreram confrontos com mortes entre a marinha dos dois países em 1999, 2002 e 2009.
Para Seul, o Norte bombardeou deliberadamente a ilha de Yongpyong, cuja população civil (1.500 pessoas) é constituída de pescadores. Cerca de mil soldados estão estacionados nesse pequeno território que, em sua costa norte, está repleto de peças de artilharia e de bunkers. É uma violação do armistício de 1953, avalia a Coreia do Sul.
“Política perversa”
Como não houve a intervenção de nenhum tratado de paz na sequência, as duas Coreias estão tecnicamente em estado de guerra. Não se sabe quais foram os danos causados ao Norte pelo tiro de resposta do Sul. O presidente Lee deu ordens de atingir a base norte-coreana de mísseis próxima da costa diante da ilha de Yongpyong, em caso de nova provocação.
Apesar dos riscos de deslizes e de um arroubo da imprensa conservadora que pede por uma prova de firmeza “frente a um cachorro louco” (no jornal “Dong-A”) e considera o bombardeio norte-coreano um “crime de guerra” (no jornal “Chosun”), a população sul-coreana não parece estar mais preocupada do que o normal: há décadas ela vive sob a ameaça de repetidos incidentes, de maior ou menor gravidade, com o Norte. Por enquanto, as represálias do Sul parecem descartadas em razão da escalada que ela causaria (perdas materiais e perdas de vidas humanas). Como no caso do naufrágio, em março, do navio sul-coreano Cheonan (46 mortes), torpedeado pelo Norte segundo os resultados de uma investigação internacional – não endossados pela China nem pela Rússia, e rejeitados por Pyongyang – , a Coreia do Sul e seus aliados americanos e japoneses não têm muitas opções.
Condenações e sanções quase não têm efeito sobre um regime que já é banido da comunidade internacional. E mais uma vez se levanta a questão: é mais eficaz pressionar um regime isolando-o, ou é preciso buscar negociar sobre bases aceitáveis? O presidente Lee Myung-bak escolheu a primeira opção. E a administração Obama praticamente não mostrou nenhuma iniciativa sobre a questão.
Em seu último Livro Branco sobre a diplomacia, Seul condena a política de aproximação Norte-Sul adotada de 1998 a 2008 pelos governos de centro-esquerda, que é considerada “perversa”, pois o Norte não fez nenhuma concessão apesar da ajuda do Sul. No entanto, há aqueles no Sul que pedem por uma política se não mais conciliadora, pelo menos mais eficaz em termos de prevenção de riscos de conflito.
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