O Equador rompeu suas relações diplomáticas com a Colômbia em 2008. A Venezuela expulsou o embaixador colombiano de Caracas. A morte do líder guerrilheiro Raúl Reyes, assassinado pelo exército colombiano em território equatoriano, graças às informações fornecidas pelos americanos, causou uma crise diplomática sem precedentes. A maior parte dos observadores duvida que a crise possa descambar para um confronto militar. Segundo uma pesquisa, 61% dos colombianos acreditam que um conflito armado com a Venezuela seja possível.
Bogotá tentou acalmar a situação anunciando que não enviaria reforços para as fronteiras. “Nós temos a capacidade de mobilizar nossas tropas, mas não vemos nenhuma necessidade de fazê-lo”, declarou o ministro da Defesa, Juan Manuel Santos. As operações do exército colombiano, lembrou, são dirigidas contra a guerrilha, e não contra os países vizinhos.
No dia anterior, o presidente venezuelano, Hugo Chávez, havia ordenado o desdobramento de dez batalhões e da força aérea até a fronteira com a Colômbia. Seu colega equatoriano, Rafael Correa, também decidiu reforçar os efetivos militares fronteriços. No meio tempo, as acusações vinham de todos os lados, e não eram do tipo a tranquilizar as tensões. Os documentos encontrados no laptop do número 2 das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc, extrema esquerda) confirmaram as ligações entre a guerrilha e os governos vizinhos. O diretor da polícia colombiana, o general Oscar Naranjo, indicou que as Farc teriam recebido US$ 300 milhões (R$ 525 milhões) do governo venezuelano, sem especificar a data nem as razões do pagamento.
“O computador de Raúl Reyes se tornou uma fábrica de mentiras”, respondeu o ministro venezuelano das Relações Exteriores, Nicolas Maduro. Algumas horas mais tarde, seu colega do ministério do Interior, Ramón Rodriguez Chacin, afirmava que o general Naranjo estava envolvido no tráfico de drogas, lembrando que o irmão do militar colombiano estava preso na Alemanha.
Entretanto, em Quito o ministro equatoriano da Segurança, Gustavo Larrea, confirmou ter encontrado pessoalmente Raúl Reyes, como Bogotá havia acusado na véspera. Mas Larrea desmentiu a existência de um acordo político com a guerrilha. O encontro teria ocorrido somente por “fins humanitários”. O presidente Correa acrescentou que esses contatos eram conhecidos de Bogotá (que desmentiu). Segundo ele, eles teriam permitido libertar doze reféns das mãos das Farc, entre os quais Ingrid Betancourt e os três cidadãos americanos, se o exército colombiano não houvesse interferido. “A mão dos belicistas autoritários estragou tudo”, segundo o presidente equatoriano.
As mensagens citadas pelo chefe da polícia colombiana, cuja autenticidade foi contestada por Quito, revelaram a existência de uma negociação a respeito de reféns sob o poder da guerrilha. Além disso, o general Naranjo afirmou que as Farc teriam comprado 50 quilos de urânio. Bogotá afirmou que denunciaria o apoio dado às Farc por seus vizinhos junto à ONU e à Organização dos Estados Americanos (OEA). A guerrilha está na lista das organizações terroristas dos Estados Unidos e da União Europeia.
A Colômbia parecia isolada no cenário internacional. Diversos governos latino-americanos – entre os quais o Brasil, o Chile e a Argentina – condenaram o ataque colombiano no Equador e exigiram que Bogotá se desculpasse. Quito, entretanto, recusou as desculpas do ministro colombiano das Relações Exteriores, Fernando Araújo. Somente Washington deu seu apoio ao presidente Álvaro Uribe, seu aliado. A Casa Branca pediu que a Colômbia e o Equador agissem com moderação e se “espantou” com a conduta de Chávez.
Em Caracas, a oposição venezuelana criticou a “irresponsabilidade guerreira” do presidente Chávez. O general Raúl Baduel, seu ex-ministro da Defesa, afirmou que o exército venezuelano não seguiria o chefe do Estado em uma aventura bélica. “Hugo Chávez poderá acabar como Marlbrough, indo para a guerra sozinho”, declarou. “Na condição de ministro da Defesa, posso afirmar a responsabilidade com a qual o exército colombiano garantia sua coordenação com a Venezuela”, disse. “A Venezuela não foi agredida, nem ameaçada. Não temos inimigos”. Segundo o general Baduel, que por muito tempo foi próximo do presidente venezuelano, Chávez está tentando desviar a atenção, uma vez que há uma série de dificuldades internas e que sua popularidade vem caindo.
Na Colômbia, pelo contrário, o momento é de uma união sagrada. “O presidente Hugo Chávez conseguiu um feito incrível: até a esquerda está apoiando o presidente Álvaro Uribe”, observa um diplomata europeu em Bogotá. Ao mesmo tempo em que critica a incursão do exército em território equatoriano, a oposição colombiana considera “desproporcional” a reação da Venezuela, e inadmissíveis os insultos proferidos por Chávez a respeito do presidente Uribe.
A maioria dos observadores acredita que o risco de uma derrapagem bélica continua limitado, especialmente em razão da interdependência comercial dos três países andinos envolvidos. O comércio entre a Colômbia e o Equador chega a US$ 2 bilhões. Entre a Colômbia e a Venezuela, a US$ 6 bilhões. A Colômbia é uma grande fornecedora de eletricidade para o Equador e de alimentos para a Venezuela, que há meses vem enfrentando uma grave escassez e dificilmente pode considerar ficar sem produtos colombianos. Entretanto, segundo a imprensa de Bogotá, a fila dos caminhões colombianos presos nos postos fronteiriços com a Venezuela já se estendia desde a noite de segunda-feira.
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